Neste opúsculo sou tentado a refletir que o rio é tão semelhante a mim, tanto em natureza quanto em essência. Assim concebo pelo fato de termos um inicio, e desde esse inicio nos movemos em direção ao fim. É pensando desse modo que dou vida e forma à idéia segundo a qual, embora almejemos diferentes coisas segundo nossas distintas naturezas, essas coisas são as mesmas em essência. O rio, assim como eu, nasceu pequeno e singelo, foi crescendo, adquirindo tamanho e formas definidas, conquistando espaços, ganhando respeito e admiração. Assim, aos poucos eu e o rio vamos superando os primeiros obstáculos. Eu, em minha peregrinação terrestre, vou deixando minhas marcas, firmando meu nome, construindo minha identidade. Assim como o rio em seu curso, somos causa de alegria para muitos, e de tristeza também. Muitos se aproximam de nós para restaurar suas forças, compartilhar sofrimentos, ambos somos por vezes causa de inspiração para o poeta, objeto de estudo para o cientista, e até o filosofo se ocupa em pensar sobre nós. Desse modo, ainda que distante que seja o percurso e demorada a chegada tanto do rio quanto minha, vivemos buscando atingir nosso destino. Tanto um quanto o outro geramos vida e também a eliminamos, ora cuidamos da vida, ora a ferimos, somos ora queridos ora desprezados, somos tanto dóceis como vorazes, tanto calmos como agitados, tanto fortes como fracos, tanto belos como feios, mas ambos sabemos que só teremos cumprido nossa missão quando por fim atingirmos nossos destinos. Dizendo de outro modo: quando tivermos atingido o fim para o qual fomos feitos. No caso do rio, fundir-se ao mar. No meu caso, fundir-me ao amor. Só assim seremos lembrados e imortalizados pelos que souberam entender nossa essência, nossa natureza e desfrutar nossa presença. Eu e o rio, essência e natureza, no nascer e no morrer.
Dir-se-á que o excesso de alegorias, ao poema que tende tocar, pode embotá-lo. Creio que estes sejam pensamentos aviltados pelas idéias novas que, abrindo mão do conteúdo semântico proposto pela poesia, diz que este instrumento de descrição das emoções de um homem dentro do seu tempo, esconde as suas belezas mais singelas no caractere que lhe é, todavia, primordial: a palavra.
ResponderExcluirPois, meu caro, a sua prosa-poética desmente isso: nos mostra que, mesmo contrariando Caeiro, há certa similitude entre a nossa vida e o destino de um rio, já que ambos desaguam ao pé do fado.
Abrs,
João Paulo dos Santos
Quanta sensibilidade...
ResponderExcluirParabéns pelas palavras!